Em ano eleitoral, tudo é possível. Não obstante o veto presidencial ao projeto aprovado pelo Congresso Nacional, transferindo para as Assembleias Legislativas a faculdade de criação de novos municípios, volta a tramitar no Senado Federal nova proposta no mesmo sentido, fazendo a festa especialmente dos deputados estaduais.
Essa nova proposição tramita com celeridade, porque, segundo justificam os políticos, resulta de acordo negociado com o governo para preservar o veto governamental. De autoria do senador Mozarildo Cavalcante (PPB-RR), a proposta incluiu em sua redação duas alterações significativas. Elas funcionariam como filtro para selecionar previamente a criação de municipalidades.
A primeira exigência, agora estabelecida, seria a da população mínima do distrito-candidato à emancipação de 8,5 mil habitantes. A segunda, a assinatura de 20% dos moradores no documento anexado ao pedido de elevação do distrito em município. Ainda assim, se o projeto for aprovado, todas essas exigências serão facilmente contornadas.
Por conta do ano eleitoral, quem prometeu emancipar distritos têm desenvolvido gestões junto às cúpulas dos partidos, sobretudo, os da base aliada, em busca de apoio para a criação de reservas de "colégios" eleitorais para a renovação de seus mandatos. Nessa guerra, não há a menor preocupação com os elevados custos que o município nascente acarreta, porque desfalcará os minguados recursos disponibilizados ao município-sede de onde ele provém. O orçamento será partilhado entre eles.
O projeto anterior foi vetado pela presidente da República por provocar despesa adicional expressiva, sacrificando as finanças municipais alcançadas por cortes bruscos nas transferências constitucionais do ano passado. Os gestores públicos têm suas ações executivas submetidas a controle de receita e despesa, em virtude dos orçamentos anuais e da lei de responsabilidade fiscal.
Estes diplomas legais são apenas alguns dos vários compromissos exigidos de ocupantes de cargos públicos. A violação de seus limites implica em crime de responsabilidade e, consequentemente, a inabilitação para quaisquer funções públicas. O político, ao garantir aos eleitores desinformados desses limites a criação de novas cidades, está igualmente incorrendo em erro proposital.
No Ceará, 30 distritos são candidatos a mudanças de status com sua transformação em municípios. O quadro porém não é dos mais favoráveis. Levantamento promovido pelo IBGE dá conta das condições enfrentadas pela maioria dos últimos 595 municípios instituídos no País. Surgidos em 1997, apresentam baixa qualidade de vida e a expressiva maioria se mantém abaixo da média dos demais. Não progrediram.
Do total de 595 dessas jovens cidades, 570 não evoluíram a ponto de alcançar novos estágios no Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) de seus Estados, que avalia renda, escolaridade e expectativa de vida. Os municípios-mater também não alcançaram o IDH estadual, depois que perderam área e população pelo desmembramento. O resultado é frustrante, porque apresentam quadros de subdesenvolvimento como distritos, agora agravados como cidades.
A Confederação Nacional dos Municípios, diante do vasto elenco de demandas pressionando suas intervenções, defende a emancipação de locais afastados das sedes, como ocorrem no Norte, no extremo Sul ou no Centro-Oeste. Insistir nessa aventura temerária só favorece a quem anda em busca de votos.