Ninguém sabe, ninguém viu, ninguém vende. “Tem a lanterna que dá choque?”, O POVO quis saber, sem se identificar, dos vendedores de oito lojas do Centro na tarde de ontem. A resposta foi unânime: “Não”. “Sabe quem vende?”, insistimos. “Não”. O olhar era de desconfiança, e os comentários sussurrados entre os lojistas davam conta de uma visita da Polícia Federal na manhã de ontem. Vinte e quatro horas após denúncia exclusiva de O POVO, sumiram das lojas as lanternas que dão choques elétricos de até 2 mil volts, podendo levar à morte, e vinham sendo vendidas sem nota fiscal. Não se sabe se foi a Polícia Federal que apreendeu as lanternas ou se os próprios lojistas recolheram. A PF foi procurada para informar se houve apreensão das mercadorias - e a quantidade -, mas não houve resposta até o fechamento desta edição. Em visita de fiscalização da Receita Federal ao Mercadão Shopping, na manhã de ontem, foi constatada a ausência dos produtos. Além do empreendimento fiscalizado pela Receita, O POVO visitou lojas da rua Pedro Pereira e dos shoppings Diogo e Dos Fabricantes. A lanterna não estava mais à venda.
Em uma das lojas, a vendedora comentou conhecer uma senhora que havia sido hospitalizada após sofrer choque de um assaltante de porte da lanterna. A descarga elétrica da “arma” é oito vezes maior que a Taser, arma utilizada pela Guarda Municipal de Fortaleza, segundo o professor e coordenador do curso de Engenharia Elétrica da Unifor, Wellington Brito. De acordo com um segurança particular que trabalha no ramo há cinco anos, é “facinho” adquirir o objeto. Há três meses, ele diz ter comprado por R$ 30 de um vigilante e defende o uso para “inibir a ação” de assaltantes, evitando o uso da arma de fogo.
Inmetro e representação
O POVO esteve ontem na sede do Instituto de Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia (Inmetro), onde entregou a lanterna, que será analisada. Para o diretor técnico José Lobo, o produto é uma “verdadeira arma” e não poderia estar em circulação. “Isso é um caso de polícia, esse equipamento pode matar uma pessoa”. Fotos do equipamento seriam enviadas para a sede do órgão em Brasília (DF).
O deputado estadual Heitor Férrer (PDT) enviou ontem representação ao Ministério Público Estadual, com base nos artigos 8º, 9º e 10º do Código de Defesa do Consumidor, solicitando “que sejam tomadas as providências cabíveis”. Hoje o parlamentar apresentará a mesma denúncia junto ao Ministério Público Federal. ENTENDA A NOTÍCIA
Além de Heitor Férrer, o vereador João Alfredo se envolveu no caso com o plano de convocar audiência pública e debater a regulamentação do comércio das lanternas. MPE está ciente e estuda melhor maneira de atuar. Saiba mais
Trechos da representação de Heitor Férrer:“Tal equipamento não possui nenhum tipo de controle ou regulamentação pelos órgãos públicos e está sendo vendido sem nota fiscal, o que fundamenta mais a irregularidade em sua comercialização.
Diante do exposto, considerando que os fatos narrados caracterizam, em tese, ofensa aos direitos difusos da população (potenciais consumidores) e ao Código de
Defesa do Consumidor, requer-se ao Ministério Público que sejam tomadas as providências cabíveis.”
Código de Defesa do ConsumidorArt. 8º: Os produtos e serviços colocados no mercado de consumo não acarretarão riscos à saúde ou segurança dos consumidores; Art. 9º: O fornecedor de produtos e serviços potencialmente nocivos ou perigosos à saúde ou segurança deverá informar, de maneira ostensiva e adequada, a respeito da sua nocividade ou periculosidade;
Art.10º: O fornecedor não poderá colocar no mercado de consumo produto ou serviço que sabe ou deveria saber apresentar alto grau de nocividade ou periculosidade à saúde ou segurança.