Emoção e frieza no segundo turno
Há um adágio, sobre cuja autoria não estou certo, que sintetiza o sentimento em relação ao segundo turno da eleição no Ceará. “Não crie expectativas, crie porcos. Se tudo der errado, ao menos você terá bacon”. O resultado eleitoral do último domingo no Ceará rompeu as expectativas estabelecidas dos dois lados. A surpresa teve reflexos diversos nas duas alianças que seguem na disputa. Líder de todas as pesquisas até a boca de urna, Eunício Oliveira (PMDB) dizia ao longo do dia que não trabalhava com a hipótese de não vencer no primeiro turno. Postura curiosa, uma vez que todos os institutos indicavam essa possibilidade, mas nenhuma cravava certeza.
Antes do momento de o candidato votar, no Náutico, na tarde de domingo, perguntei se, a despeito do desejo e da confiança de que venceria no 1º turno, ele estava preparado para o caso de ter de ter de enfrentar 2º turno. “Preparado... Preparado”, respondeu, sem aparentar dar muito crédito à possibilidade. Em seguida, porém, acrescentou: “Não estou trabalhando com a hipótese de segundo turno” (veja vídeo: http://bit.ly/1pIPYxD). Não estava mesmo. Quando veio o resultado, ainda mais o colocando abaixo de Camilo Santana (PT), o abatimento foi indisfarçável.
Do lado governista, Cid Gomes (Pros) no início da tarde também fazia discurso de vitória já no primeiro turno. Mas, ficaria evidente horas depois, falava isso mais para dar ânimo aos aliados, receosos e abatidos diante das pesquisas. Com a apuração, festejou a dianteira parcial de Camilo com ênfase que não se viu nem nas duas vezes em que foi eleito governador (assista: http://bit.ly/1q0mZEy).
A rigor, deslocado do contexto, o resultado de Eunício está longe de ser ruim. É apenas a segunda vez na história do Ceará que a eleição de governador vai para o segundo turno. A diferença de 1,4 ponto percentual – uma das menores do Brasil – diante do candidato de um governo com bons índices de popularidade e extremo poder político não é desempenho que possa ser considerado negativo.
Assim como, para um governo que construiu tal hegemonia, a necessidade de disputar segundo turno não era o plano original. Há recado político embutido em votação tão parelha e expressiva para a oposição – que, somada, foi maioria. Em tese, para um candidato governista é mais difícil atrair outros votos no 2º turno que para um opositor.
Todavia, a realidade não existe fora de seu contexto. A princípio favorita, a candidatura de Eunício mergulhou em certa depressão. As últimas pesquisas já mostravam queda constante da vantagem do candidato peemedebista nas simulações de segundo turno. A hipótese era incômoda de início. O segundo lugar no primeiro turno soou, no impacto inicial, como sentença de derrota que estaria por vir. Ao passo que os governistas reagiram como quem tem certeza de que sairão vitoriosos.
Como disse Eunício ainda no domingo, ele sabia que enfrentaria adversário duríssimo, e o segundo turno se prenuncia ainda mais árduo. Camilo saiu do 1º turno com aparente favoritismo e militância muito mais empolgada. O PMDB recomeça hoje a campanha tentando reverter a imagem que ficou de desânimo, quase derrota antecipada. Tomada pela emoção e pelo espanto com algo que não esperavam, embora tivesse sido possibilidade sempre presente, faltou à candidatura a frieza de quem sabe que, no domingo, era travada a primeira fase de uma disputa cuja chance de prorrogação sempre esteve no horizonte, embora até soasse improvável há poucas semanas. O fator emocional nessa largada torna a vantagem de Camilo maior que o 1,4 ponto percentual das urnas. Ainda assim, é só o começo de três intensas semanas. A partir de hoje, a campanha de Eunício tratará de tentar apresentar outro estado de ânimo e propagar confiança, enquanto Camilo evitará a aparência de “já ganhou” que por vezes transpareceu.
NOVA OPORTUNIDADEO segundo turno dá oportunidade para Camilo e Eunício finalmente apresentarem os respectivos programas de governo, para além das “diretrizes” vagas entregues no registro da candidatura.