O deputado estadual Renato Roseno (Psol), único de sua legenda com cargo na Assembleia Legislativa, relata que há uma dificuldade crescente por parte da oposição ao Governo do Estado em atuar no Parlamento, tendo em vista o tamanho diminuído dessa bancada na legislatura que iniciou ano passado. Em conversa com O Estado, o parlamentar também falou sobre as perspectivas para as eleições municipais, a política de segurança posta em prática pelo governo estadual em 2019 e a atuação da Comissão de Direitos Humanos da Assembleia, a qual ele preside.
Confira:
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O Estado. Como avalia a atuação da Comissão de Direitos Humanos da Assembleia em 2019?
Renato Roseno. Foi um ano muito agitado, foi uma das comissões que mais viajou ao interior. A Comissão de Direitos Humanos tem pautas muito variadas, né, tem direito da criança e do adolescente, LGBTs, de comunidades rurais em conflito, comunidades em conflito urbano, violência policial, prisional, direito da mulher… Fizemos mais de 40 eventos públicos, ou seja, uma atividade por semana. Houve um intenso recebimento de denúncias, foram mais de 120 casos denunciados na Comissão. Tivemos uma importante relação com outras comissões de Direitos Humanos. Há uma consciência de que há um processo de recrudescimento da violência institucional e muitas situações negativas, fizemos várias mediações com relação a direito à saúde, foram várias situações. Então o escopo de atuação foi muito abrangente.
OE. Como avalia esse primeiro ano da nova legislatura no Parlamento?
RR. A oposição ficou mais difícil, né? A oposição hoje é menor do que nas legislaturas anteriores, então o perfil de oposição agora ficou mais difícil. É uma maioria do governador, digamos assim, acachapante, então coisas muito simples são muito dificultadas por essa maioria acachapante do governo.
OE. Como vê o resultado da tramitação da reforma da Previdência estadual?
RR. Foi um atropelo. Porque veja, a matéria chegou dia 10 e dia 19 já foi aprovada. Em nove dias alterou-se a Previdência de 170 mil servidores ativos, inativos e pensionistas. Quer dizer, não houve tempo. Se pegar a reforma federal, demorou nove meses. A daqui demorou nove dias.
OE. E quais são as prioridades para o seu mandato em 2020?
RR. O Legislativo tem três funções: fiscalizar, reivindicar políticas públicas e propor melhorias nessas políticas. Nesse ano de 2019 consegui aprovar acho que oito leis, então vou continuar fazendo isso e tentar cada vez mais fortalecer o polo de esquerda alternativa na sociedade cearense, que é a tarefa do Psol.
OE. As pessoas têm manifestado preocupação sobre o clima em que vai estar a campanha para as eleições de 2020, com a perspectiva de polarização. O que pensa sobre isso?
RR. Vai ser um terceiro turno, uma eleição muito nacionalizada. Exatamente porque existe um avanço no Brasil de tendências fascistas, por exemplo essas declarações recentes contra a democracia, episódios de censura às artes, ataques à imprensa a partir do presidente da República… Há uma escalada autoritária e temos que sobretudo fazer o processo eleitoral de defesa da democracia. É muito perigoso você ver um governo que claramente flerta abertamente com tendências autoritárias, censura filmes de conteúdo LGBT, ataca a mídia, restringe a participação social, tem uma agenda econômica de retirada de direitos, com processo de precarização da classe trabalhadora.
OE. Segurança e controle de presídios foram temas recorrentes na política cearense em 2019. O que se aprendeu com o que passamos? O que se leva para 2020 disso?
RR. Eu acho um erro apostar numa lógica de recrudescimento da violência institucional. O governo não apoia uma lógica de prevenção, apoia basicamente uma lógica de recrudescimento penal, de encarceramento. Com 24 ou 25 mil internos, você não pode dizer que estão ressocializados a partir dessas políticas. Você não vê a política ressocializante, pelo contrário, fortalece cada vez mais a lógica de confrontação entre o interno e a administração. E a tarefa do processo penal, do sistema penal, deveria ser de ressocialização, humanização para reconstrução de processos de vida do interno, para diminuir a violência. A longo prazo, isso vai estourar e o que está acontecendo no Ceará não é algo inédito. Essa cartilha já é bastante conhecida. Para o ponto de vista orçamentário, a administração prisional é cara, por um lado, e por outro lado ineficaz, do ponto de vista das alterações estruturais que a sociedade quer. Está faltando racionalidade, mas o governador encantou-se com essa lógica de populismo penal que está fortalecendo.
OE. Fala-se também sobre a preponderância das chamadas pautas de costumes nas discussões do Legislativo, principalmente em 2019. Como você vê isso?
RR. O que seriam pautas de costumes? Direitos das mulheres? Da população LGBT? Na verdade temos uma estrutura de negação histórica de direitos. Somos uma sociedade colonizada, escravista, temos séculos de herança estrutural misógina, racismo, patriarcalismo, homofobia, e essas estruturas precisam ser compreendidas. Há uma agenda conservadora de moralismo que busca galvanizar um certo apoio em uma base social, com temas desse moralismo conservador. Agora o que na verdade se faz é tentar retroceder em matérias de direitos, de cidadania. A garantia de direitos da população LGBT tiraria direitos de quem? Ninguém. Então o que se tem é que se vive um processo de destituição dos direitos de cidadania.