Candidatas pelo MDB que receberam repasses de fundos públicos no Ceará "devolveram" parte do investimento em despesas feitas com o partido na eleição passada. Ao todo, sete mulheres que concorreram a vagas pela sigla em 2018 declararam à Justiça Eleitoral gastos de R$ 786,8 mil com o próprio diretório do MDB no Estado.
Entre elas estão as candidatas a deputada estadual Professora Leila e Dra. Zuíla, que receberam cerca de R$ 385 mil cada e só tiraram, respectivamente, 395 e 258 votos. Parte do embolso, revelado ontem pelo O POVO, foi repassado para o MDB cearense em pagamentos de R$ 147,7 mil e R$ 175 mil das candidatas, feitos às vésperas do fim da campanha eleitoral.
Segundo o secretário-geral do MDB do Ceará, João Melo, os repasses foram feitos para cobrir despesas extras que o partido teria tido com as candidaturas, como contratação de advogados e produção de programas de televisão. "Em todo processo eleitoral, você tem um conjunto grande de despesas outras além das do dia a dia (...) tudo isso é dividido entre os candidatos", afirma.
A própria proporção de pagamentos feitos pelas candidatas, no entanto, contradiz a justificativa do emedebista. Mesmo recebendo apenas 35% dos repasses do fundo eleitoral entre candidatos a deputado do MDB, mulheres foram, por outro lado, responsáveis por 92,67% de todos os pagamentos declarados para o partido durante a eleição.
Além disso, nenhum dos 14 homens que disputaram vagas de deputado pelo partido chegaram perto do valor repassado pelas candidatas. Entre eles, apenas cinco declararam despesas diretas com o MDB, com repasse de R$ 12,5 mil - para pagamento de programas de TV - em todos os casos.
Ouvidas pelo O POVO na quarta-feira, Professora Leila e Dra. Zuíla não quiseram falar sobre a verba do partido, mas se mostraram surpresas com os valores que teriam recebido segundo dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). "Eu recebi isso aí? Você tá.. (risos) você tá muito mal informado", diz Zuíla. Já Leila afirma ter recebido R$ 250 mil, e não os R$ 397 mil declarados à Justiça.
Em várias notas fiscais emitidas pela campanha das duas, endereços e telefones informados pelas candidatas são os do diretório do MDB do Ceará. Questionado sobre todos esses pontos, João Melo evitou resposta e recomendou que fosse procurado o ex-vice-prefeito de Fortaleza, Gaudêncio Lucena: "Não tenho informação sobre essas questões".
Fontes ouvidas pelo O POVO destacaram que, segundo entendimento em vigor do Supremo Tribunal Federal (STF), recursos do fundo eleitoral devem ser usados exclusivamente para custear campanhas dos candidatos beneficiados, sendo vedados outros repasses.
Desde o início do mês, o Ministério Público Federal (MPF) abriu diversas investigações para apurar repasses de partidos para supostas "laranjas" - candidatas lançadas para burlar cotas para mulheres. Segundo a lei eleitoral, pelo menos 30% de todas as candidaturas de siglas deve ser feminina.
A reportagem tentou entrar em contato ontem com Professora Leila e Dra. Zuíla, mas não obteve êxito. Já chamadas ao celular de Gaudêncio Lucena não foram completadas.