“Nós vamos agora colocar nosso exército na rua”, disse ontem, logo que confirmado o resultado das urnas, o prefeito Roberto Cláudio (PDT). O candidato à reeleição, no entanto, foi mais específico: “Esse exército não usa arma, não faz coação, não planta medo e o terror. Nosso exército ama essa cidade”, falou, arrancando aplausos da plateia presente em seu comitê, no bairro Cocó.
Foi assim, com discurso de críticas e provocações veladas ao rival Capitão Wagner (PR), que o prefeito deu início à disputa de 2º turno na Capital. “O debate agora fica mais claro. Não vai ter mais personagem, jogo publicitário, conversa fiada”, avaliou, sob olhar marejado de seu candidato a vice, o deputado Moroni Torgan (DEM) - “um gigante em tamanho e em competência”.
O discurso, acompanhado de perto pela esposa Carol e as filhas Isabela e Roberta, foi interrompido depois das primeiras palavras para o prefeito extravasar as lágrimas. Com pausas entre cada fala para receber as manifestações de apoio da plateia, o prefeito agradecia “cada um” dos 524,9 mil votos que o alçaram ao 2º turno na Capital.
“Vamos bater na porta de cada eleitor dessa cidade, calçando as sandálias da humildade. Não podemos deixar que a cidade caia na armadilha da aventura (...), administrar uma cidade como Fortaleza não é para amador, para aventureiro”, disse RC, dizendo-se “mais experiente” para um segundo mandato.
Às lágrimas, o prefeito prometeu 2º turno “sem baixaria”, queixando-se de boatos e ataques infundados de adversários. “Ao invés de partir para o confronto, arregaçamos as mangas, mostramos nossas obras”, disse, enumerando ações como UPAs, viadutos, ciclofaixas, postos de saúde e Areninhas.
Obras da gestão, aliás, marcaram presença na festa, com diversas fotos de ações espalhadas pelo comitê. Faixas e bandeiras com aliados do pedetista, como os irmãos Cid e Ciro Gomes (PDT), eram praticamente inexistentes. “Agora, é hora de comparar as biografias, a viabilidade das propostas”, disse.
Após a fala, RC se jogou aos braços da plateia, com o titular da Agência de Desenvolvimento do Ceará (Adece), Ferruccio Feitosa, tentando reencenar o ato - executado em 2012 - de erguer o prefeito nas costas. Neste ano, no entanto, a cena acabou abortada em meio à confusão.
Candidato derrotado quatro vezes à Prefeitura - uma delas no 2º turno -, Moroni pontuou: “Ganhamos a batalha, agora não pode diminuir, tem que ir pra guerra”. O prefeito foi acompanhado pela plateia, que entoava palavras de ordem e registrava tudo em selfies. A festa também chamou atenção pela estrutura, tendo direito a baldes de champanhe, diversas telas de LED e até food truck.
Estratégia é “a verdade”
Em coletiva de imprensa após o discurso, RC destacou que sua principal estratégia agora será “falar a verdade”. Sobre polêmica do armamento da Guarda Municipal, que pautou debate no 1º turno, o candidato diminuiu a questão, mas manteve postura de “nem sim, nem não”.
“Não estou convicto de que é a melhor opção (armar a Guarda). Precisa ter estudo, precisa ver a viabilidade, e não por ideologia. Se fizermos isso, não será de afogadilho, para ganhar eleição. É um tema muito amplo para ficar em maniqueísmo”, disse. “Até porque não é isso que vai resolver ou não o problema da violência.”
RC disse também não temer que o alto custo de sua campanha, 2ª mais cara do País e que arrecadou R$ 7,7 milhões, seja explorado por Capitão Wagner. “Não temo. O pecado e raiz da corrupção é justamente nas contas em que o gasto não é declarado, gente que tem um gasto declarado que não condiz com o tamanho das estruturas.”
Segundo ele, a declaração de despesas é “compromisso com a transparência”. “Maior prova é ver que, nesses quatro anos, você não tem uma crise, uma denúncia”, respondeu RC, que falava em cima de duas cadeiras para ficar na mesma altura de seu vice.
Nós vamos agora colocar nosso exército na rua, mas esse exército não usa arma, não faz coação, não planta medo e terror. Ele ama a cidade
Vamos bater na porta de cada eleitor dessa cidade (...), não podemos deixar que uma cidade como Fortaleza caia na armadilha
da aventura
Ao invés de partir para o confronto, arregaçamos as mangas, mostramos nossas obras (...). Agora é hora
de comparar biografias, propostas
ALTOS
Distantes no 1º turno, aliados como Cid e Ciro Gomes devem ampliar participação na campanha. Sem PT na disputa, Camilo também pode ajudar.
Além de sair dez pontos na frente, RC também tem maior número de vereadores em sua base, com 32 eleitos
BAIXOS
Tende a ter maior dificuldade em conquistar eleitores, visto que demais candidatos eram todos de oposição à sua gestão.
Seu candidato a vice, Moroni, é rejeitado por demais candidatos e pode atrapalhar a conquista de aliados no 2º turno
PONTO DE VISTA
A cobrança ganha foco na nova etapa
É recorrente o erro de, em tempos de disputas eleitorais, se buscar modelos prontos de estratégia para colocar em prática nos momentos delicados, como o que agora se inicia em Fortaleza. O prefeito Roberto Cláudio, que busca reeleição, tenta não incorrer no equívoco e calibra o discurso para o segundo turno na perspectiva de explorar pontos específicos que considera vulneráveis no adversário Capitão Wagner. Um aspecto a ser fartamente explorado, claro, são os vínculos do candidado do PR com o militarismo, originário que é da PM. Claro que não se trata de um defeito, em si, até podendo representar uma virtude diante do mundo assustado que habitamos, mas há inteligência estratégica no esforço de explorar o tema na sua perspectiva eleitoral. Existem setores da sociedade, expressivos e influentes, aos quais incomoda a confusão que começou a se estabelecer com maior intensidade nos últimos tempos entre a ação de servidor público e o interesse de extrair dela benefícios políticos, normalmente pessoais. O parlamentar, que se demonstra inteligente, até hoje tem conseguido sustentar a discussão de maneira competente, sempre que colocado diante dela, embora inexista certeza de que assim continue agora que a campanha entra na fase em que o olho no olho prevalecerá, com apenas dois candidatos se enfrentando. O tema virá forte, acredita-se, e o Capitão será cobrado na sua capacidade de dar resposta aos problemas de Fortaleza muito além da área da segurança pública, de onde ele veio e da qual diz ter grande orgulho de fazer parte.
Guálter George, editor-executivo de Conjuntura