Plácido Rios recebe críticas, mas até opositores dizem que ele reestruturou o Ministério Público do Estado
Foto: Jose Leomar
No dia 1º de agosto, uma quinta-feira, um texto publicado no site do Ministério Público Estadual - e enviado à imprensa -, dando conta da desincompatibilização da procuradora Vanja Fontenele, do cargo de vice-procuradora Geral de Justiça, gerou um reboliço entre promotores cearenses. A publicação explicitava a justificativa do afastamento: ser candidata ao cargo de Procuradora Geral de Justiça. Horas depois, o texto foi atualizado no site do MPCE e enviada à imprensa uma "errata", atualizando o texto para suprimir a justificativa do afastamento.
O texto dava luz a um movimento que todos já conhecem no Ministério Público, da candidatura de Vanja ao cargo - ela teria o apoio de Plácido Rios. Mas o que causou o reboliço foi o fato de que é proibido o uso de canais de publicidade de órgão público para fins eleitorais.
O episódio, entretanto, não é um fato isolado em relação à disputa interna na sucessão na Procuradoria Geral de Justiça, que já começou, muito antes do tempo (a escolha da lista tríplice está marcada para 6 de dezembro). A disputa acirrada entre os membros do Ministério Público nos bastidores está trazendo a público questões internas da Instituição e, até mesmo, trocas de acusações.
"Nós temos uma política aqui que não é muito diferente da lá de fora. Existem algumas insatisfações", reconhece o procurador geral Plácido Rios, cujo cargo está gerando a grande disputa entre grupos. A disputa pelo comando não é novidade, mas os promotores entendem que sucessão que se avizinha será uma das mais disputadas na Intituição.
O embate começou a ganhar corpo a partir de 2017, quando a PGJ iniciou um trabalho de reestruturação no Ministério Público, modificando a sua Lei Orgânica para ganhar autonomia para alterar as promotorias, por exemplo - antes, esse movimento só poderia ser feito com autorização da Assembleia Legislativa. O projeto foi aprovado no Legislativo e mexeu com interesses de muitos promotores, antecipando o crescimento das divergências internas. O próprio Plácido relembra as pressões naquele momento, mas justifica as necessidades de avançar nas reestruturações internas.
Primeiro embate
O crescimento da oposição a algumas decisões do comando, dizem alguns promotores, foi determinante na mudança de rumos em relação, por exemplo, à última eleição do comando da Associação Cearense do Ministério Público, entidade privada que congrega a representação dos promotores e procuradores. A entidade estava sob comando do mesmo grupo político desde a década passada, mas acabou tendo mudanças de comando no último pleito, ocorrido no ano passado.
O grupo que ocupava o poder na Associação, com o apoio de Plácido, sofreu perdas internas. Dois membros da gestão partiram para a oposição, o que enfraqueceu a chapa da situação. Mesmo assim, a eleição dos opositores acabou sendo bem acirrada, por 30 votos - a instituição tem mais de 500 associados.
O resultado acabou sendo considerado pelos opositores do grupo de Plácido Rios como o prenúncio do que pode ser a eleição para a Procuradoria Geral de Justiça. E o processo na ACMP iniciou o debate que não parou mais, de lá até aqui e tem se intensificado. Inclusive, confessam alguns, com a divulgação de informações duvidosas, as chamadas "fake news".
Ninguém admite à luz do dia, mas o que se sabe é que estaria em jogo, além da sucessão na PGJ, a disputa pelas vagas do quinto constitucional - a qual tem direito o Ministério Público - no Tribunal de Justiça do Ceará (TJCE). Em 2020, os desembargadores Francisco Lincoln Araújo e Silva e Vera Lúcia Correia Lima devem se aposentar, abrindo duas vagas na Corte. A indicação deve partir do governador Camilo Santana que, no entendimento de alguns promotores, tem predileção por Plácido, para ocupar um dos postos. Plácido nega a articulação. "Seria até desrespeitoso com os colegas que estão no cargo falar sobre isso agora".
A relação com o governo do Estado, aliás, é um dos epicentros da crise interna no Ministério Público, atualmente. São muitas as críticas à proximidade entre Plácido Rios e o governo Camilo Santana, o que não seria "bom para a instituição", advertiu um promotor. Até mesmo promotores simpáticos a Plácido admitem isso. Falta mais efetividade, dizem os críticos do PGJ, na fiscalização das ações do Executivo estadual, principalmente na Procuradoria dos Crimes Contra o Patrimônio Público, a Procap, justamente o órgão comandado por Vanja Fontenele, a qual nos referimos no início desta reportagem.
Plácido, na entrevista que concedeu ao Diário do Nordeste, rebateu as críticas. Ele atribui as divergências às decisões que precisou tomar ao longo da sua gestão. "Quando o procurador aqui já está nos dois últimos anos, existe o vácuo do poder. Eu não posso mais ser candidato, fica todo mundo querendo o poder e isso cria atritos. Mas faz parte do processo", minimizou.
Nomes
Embora ele não declare ainda formalmente, aliados de Plácido admitem que o grupo que está no poder, deve apoiar três candidatos. Além de Vanja Fontenele, os outros nomes a serem parte da estratégia do grupo são Manoel Pinheiro e Nestor Cabral. Na votação interna, cada membro do MP vota em três nomes. Os três mais votados formam uma lista tríplice que é enviada para a escolha do governador.
A estratégia da situação é mandar, para Camilo, três aliados. Mas há, em campo, uma estratégia da oposição de apresentar um nome forte, o do procurador Ricardo Machado, que já ocupou o posto máximo da Instituição. Até nomes mais próximos de Plácido, admitem que Ricardo deve estar na lista tríplice. Ricardo, inclusive, já está com o 'bloco na rua'. Manda, periodicamente, para promotores nomeados ainda por ele, os números de sua gestão, causando até estranhamento pelo volume de informações compartilhadas nas redes.
Na oposição, os promotores citam mais dois nomes que estariam se movimentando para concorrer na lista tríplice: o procurador Eulério Cavalcante Júnior e Miguel Ângelo Pinheiro.
"São infundadas as críticas à Procap", diz o procurador
Plácido Rios, que está no segundo mandato à frente da PGJ, diz encarar com naturalidade o embate interno na sua sucessão, admite insatisfações, mas atribui isso ao clima da sucessão e às mudanças que fez em sua gestão.
Especificamente sobre as críticas à atuação da Procap, ele diz que são infundadas. "As investigações que tínhamos sobre o Governo foram materializados em denúncias. O caso do Acquario é um deles", rebate.
Ele reconheceu, no entanto, que o sistema de Justiça, incluindo o Ministério Público, ainda tem procedimentos burocráticos que acabam atrasando os julgamentos. "A Procap nunca produziu tanto como agora", declarou ao detalhar os números. Um total de 12 prefeitos afastados, um prefeito preso, 34 operações de 2016 a 2018 contra autoridades com foro privilegiado, no caso de prefeitos. "Críticas a isso não podem ser para construir", alfineta o procurador.
Além disso, o procurador defendeu os avanços que considerou em tecnologia com sistemas de investigação e de gestão internos no Ministério Público e a contratação de 300 assessores para os promotores e mais 165 cargos que estão sob análise do Conselho de Procuradores.
"Aqui, não temos hierarquia. Nós administramos pelo poder de convencimento. Eu não posso dizer o que o promotor deve fazer. Eu não mando em promotor e essa é a dificuldade de gestão que temos".