Bolsonaro em Fortaleza em 2018. Na campanha, Heitor Freire e André Fernandes dividiam palanque
Foto: José Leomar
A cúpula do PSL no Ceará foi atingida em cheio pela crise que o partido do presidente Jair Bolsonaro enfrenta no País, após o vazamento de áudios de uma conversa dele com o deputado federal Heitor Freire, presidente do PSL no Estado. O envolvimento do parlamentar cearense na disputa pela liderança do PSL na Câmara aumenta o racha da sigla no Ceará e dá munição para lideranças estaduais do PSL rompidas com Freire criticarem o seu comando.
O dirigente tomou os holofotes, ontem, em mais um episódio da crise entre Bolsonaro e o presidente nacional do partido, Luciano Bivar. Isso porque áudios de uma conversa entre Bolsonaro e Heitor Freire sobre a disputa pela liderança do PSL na Câmara foram divulgados e lançaram sob o cearense a suspeita de ser o autor do vazamento. O deputado, em nota, admitiu o diálogo, mas negou ser o responsável pela divulgação.
Liderança
Na conversa, Bolsonaro trata da articulação para obter apoio do maior número de deputados do PSL à nomeação do filho, o deputado federal Eduardo Bolsonaro, para o cargo de líder da bancada do PSL na Câmara, no lugar do Delegado Waldir.
"Da maneira como está... Que poder tem na mão o presidente (do partido) e o líder aí? Poder indicar pessoas, arranjar cargo no partido, promessa para fundo eleitoral por ocasião das eleições, e isso que os caras têm, mas você sabe que o humor desses caras de uma hora para outra muda", alega.
Parlamentares ligados ao presidente nacional do partido, Luciano Bivar, entre eles Heitor Freire, no entanto, contra-atacaram e protocolaram uma lista, com maior número de assinaturas de deputados, pedindo a manutenção de Waldir na liderança. Waldir e o grupo de Bolsonaro acabaram derrotados, agravando ainda mais as brigas internas.
Depois da oficialização da liderança, no fim da manhã de ontem, Bolsonaro afirmou considerar uma "desonestidade" a divulgação da sua conversa com parlamentares. À tarde, deputados ligados ao presidente vazaram áudios de Waldir em que ele diz que vai "implodir" o chefe do Palácio do Planalto, a quem chama de "vagabundo".
Horas depois do vazamento dos áudios, Heitor Freire se pronunciou por nota. Ele confirmou a conversa com Bolsonaro, mas negou ter sido o autor dos vazamentos. O deputado disse, ainda, que vai acionar a Polícia Federal para investigar os responsáveis pela divulgação do diálogo.
"Isso é criminoso e passível das medidas judiciais cabíveis. Repito, jamais divulgaria conteúdo de conversas com o presidente Bolsonaro. Sempre estive na linha de frente na defesa do Governo Bolsonaro e atritos internos do partido não farão com que mude de posição".
Saia-justa
No meio dessa implosão no PSL, Bolsonaro destituiu a deputada federal Joice Hasselmann (PSL-SP) da liderança do Governo no Congresso. Ela também assinou a lista em apoio a Waldir. Em contra-ataque, aliados de Bivar articulam a saída de Eduardo Bolsonaro do comando do partido em São Paulo e do senador Flávio Bolsonaro da presidência da sigla no Rio de Janeiro.
Além de ter apoiado o nome de Waldir para seguir na liderança do PSL na Câmara, a saia-justa para o lado de Heitor Freire aumentou, porque ele aparece na ligação com Jair Bolsonaro, que acabou vazada. O parlamentar chegou a desativar, temporariamente, páginas nas redes sociais.
O vazamento circulou por grupos de aplicativos de trocas de mensagens e subiu a temperatura entre lideranças do PSL do Ceará, que estão rompidas com a cúpula do partido aqui. Nas redes sociais, o deputado estadual André Fernandes chamou Freire de "traidor do Bolsonaro".
Reações
"Tem que ser processado na Lei de Segurança Nacional. Você foi eleito por causa de Bolsonaro e hoje mostra que não tem fidelidade com o mesmo", esbravejou em um vídeo. Em outra gravação, ele aparece queimando uma notificação do conselho de ética do partido e diz estar sendo ameaçado de expulsão. "Sigo firme com Bolsonaro. O resto que se exploda!", afirma.
O deputado estadual Delegado Cavalcante, da ala de Fernandes no PSL, disparou críticas ao comando do partido no Estado e pediu a saída de Heitor Freire do cargo de dirigente. "Entramos com uma representação contra ele", informa. "Heitor é indigno do cargo que ocupa", completa.
A representação citada por Cavalcante foi protocolada por ele e Fernandes, em junho deste ano, no diretório nacional do PSL, para afastar Heitor Freire do cargo de presidente do partido no Ceará. No documento, eles expõem supostas irregularidades do dirigente na nomeação de membros do diretório estadual e no uso da cota parlamentar para o aluguel de um escritório em Fortaleza.
À época, Heitor Freire disse que o partido avaliaria punições para os dois e gravou um vídeo com o presidente nacional do PSL, Luciano Bivar, em que ele reafirma apoio à permanência de Freire à frente da sigla. O nome do deputado federal foi renovado na presidência da comissão provisória do PSL no Ceará.
A briga no partido continuou. Durante encontro do PSL no Ceará, em agosto passado, Heitor Freire disse que tratava Cavalcante com "desprezo" e que não gostava dele. Este rebateu, afirmando que tomaria "providências" contra o dirigente.
Senador Eduardo Gomes assume função de Joice
O Palácio do Planalto já formalizou no Diário Oficial da União (DOU) a indicação do senador Eduardo Gomes (MDB-TO) na função de líder do Governo no Congresso Nacional. A mensagem do presidente Jair Bolsonaro que envia o nome ao Legislativo foi publicada em edição extra do Diário, na tarde de ontem. Escolhido para o posto, Eduardo Gomes assume a função no lugar da deputada Joice Hasselmann (PSL-SP).
A troca já havia sido confirmada pelo porta-voz da Presidência, general Otávio do Rêgo Barros. "Sendo uma prerrogativa do presidente da República escolher seus líderes para representar o Governo no Poder Legislativo, será encaminhada mensagem ao Congresso Nacional informando a substituição da deputada Joice Hasselmann (PSL-SP) pelo senador Eduardo Gomes (MDB-TO) na função de líder do Governo naquela casa legislativa", disse o porta-voz.
A situação de Joice ficou insustentável no Governo na quarta-feira, após a deputada assinar uma lista de apoio à permanência de Delegado Waldir (GO) na liderança do PSL na Câmara. Bolsonaro articulou para que um dos seus filhos, o deputado Eduardo Bolsonaro (SP), assumisse o cargo. No entanto, o grupo do PSL ligado ao presidente foi derrotado ontem, quando o deputado Delegado Waldir foi confirmado como líder da bancada na Câmara pela Secretaria-Geral da Mesa da Casa. Waldir pertence ao grupo do PSL que é ligado ao presidente da sigla, Luciano Bivar (PE).
Joice foi escolhida líder em fevereiro, pela indicação dos presidentes da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), e tinha bom trânsito com o ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, que no início do Governo era responsável pela articulação política. Ela vinha perdendo espaço, no entanto, desde que a articulação foi repassada para a Secretaria de Governo, em agosto. "Não me importo com a ingratidão. Meu couro é duro", comentou Joice.