Da BR-222, principal ligação entre Fortaleza e o norte do Ceará, é possível ver a foto gigante de Jair Bolsonaro em um outdoor na entrada de Irauçuba, encravada no sertão cearense a 150 km da capital e com 24 mil habitantes.
A imagem surpreende quem chega por lá e conhece o perfil dos eleitores da cidade: apenas 9,8% dos votos foram ao candidato do PSL no 1º turno.
Ciro Gomes (57%) e Fernando Haddad (31,3%) foram os preferidos, e a população apoiou em massa a reeleição para governador do petista Camilo Santana (quase 95%), que se dividiu entre os palanques de Ciro, seu padrinho político, e Haddad.
“Tenho ouvido muita gente que apoiava Ciro que diz que vota em Bolsonaro agora. Acho que ele terá uma votação surpreendente por aqui”, disse Jango Beltiman, 26, mecânico na oficina de motos de Luis Carlos da Silva Mota, um dos patrocinadores do outdoor.
Um grupo de comerciantes de Irauçuba decidiu fazer uma vaquinha para colocar a placa no ponto estratégico. A empresa de Mota foi escolhida porque era o ponto mais alto e mais próximo da rodovia.
Pela legislação eleitoral o outdoor nem poderia estar ali. Se o TSE decidir intervir, caso haja denúncia, quem o colocou pode pagar multa que pode chegar a R$ 25 mil.
A votação expressiva de Camilo Santana na cidade, dizem alguns moradores, ocorreu principalmente devido à promessa de asfaltar duas estradas que ligam a BR-222 a distritos mais afastados, como o de Missi. No caminho de terra que leva até lá, se vê muitas faixas e adesivos de Ciro, várias do PT e nada de Bolsonaro.
“Não sei se o pessoal daqui vota no PT por causa do asfalto, mas não vou votar em quem não tem proposta alguma [se referindo a Bolsonaro]”, disse Kellyson Barbosa, 31, que vive na Fazenda São José, próximo de Missi.
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A 78 km de Irauçuba, sempre pela BR-222, está Sobral. Com mais de 200 mil habitantes é o berço político dos Ferreira Gomes, que tem como principal representante Ciro.
Na terra dos FG, o beco do cotovelo, no centro, é uma pequena via fechada a carros com lojas e lanchonetes e onde todo mundo sabe de tudo. E por ali há quem admita que a migração de votos de Ciro Gomes pode não ir nem para Bolsonaro nem para Haddad.
“Muita gente aqui que é Ciro está dizendo que pode votar branco ou nulo. Tudo muito dividido, mas pela minha preferência é o Haddad”, disse Expedito Vasconcelos, 72, dono do Café Jaibaras.
A poucas quadras dali está a clínica e pet shop na qual trabalha a médica veterinária Fabia Karennina Mendonça Passos Braga, 40. Não por acaso ela foi escolhida, ou decidiu ser, a líder do PSL na cidade dos Ferreira Gomes. É filha de Fabio Passos da Silva, amigo de longa data de Bolsonaro, e personagem em evento importante na migração de militar para político do deputado.
Nos anos 1980, Jair e Fábio, na época colegas na Esao (Escola Superior de Aperfeiçoamento de Oficiais), foram apontados como autores da ideia de colocar bombas em quartéis como protesto aos baixos salários dos militares. Ambos negaram e foram absolvidos pela Justiça Militar.
“Sou fã do Bolsonaro desde os oito anos de idade. Quando ele se filiou ao PSL eu fui a Brasília no mesmo dia para me filiar também”, diz Fabia, que não se intimida ao ouvir que pessoas dizem que Bolsonaro é racista e homofóbico.
“Olhe meus traços. São de negro. Meu pai é negro, e era um dos melhores amigos de Bolsonaro”, disse Fabia, que tentou vaga na Assembleia cearense mas teve pouco mais de 800 votos e não se elegeu.
Mesmo assim a campanha em Sobral surpreendeu até mesmo representantes do PSL. Ciro, como esperado, venceu com 60,2% dos votos, mas Bolsonaro ficou com 20,68%, à frente de Haddad (16,08%), em um dos melhores desempenhos do capitão reformado no interior cearense.
Caucaia faz divisa com Fortaleza e é a segunda cidade mais populosa do Ceará, com mais de 360 mil habitantes. O mercado central está repleto de ambulantes, que vendem de peixe a bugigangas de R$ 0,99. Uma só barraca vende um item com alta procura por R$ 25 (negociáveis): a camisa com a foto de Bolsonaro.
“Está vendendo bem. Minha mãe não queria colocar, por medo que alguém não gostasse, mas meu pai fez questão”, diz Fernanda da Silva, 17.
Atualizado por Natasha Ribeiro