Superlotação, baixo contingente de agentes penitenciários, desocupação dos presos. Estes são alguns dos graves problemas do sistema penitenciário nacional. Problemas que comprometem o real sentido do sistema: a ressocialização. No Ceará, não é diferente, segundo afirma o presidente da comissão de direito penitenciário da Ordem dos Advogados do Brasil, secção Ceará, o advogado Márcio Vitor de Albuquerque. Preocupada com os problemas, a OAB do Ceará tem realizado diversas ações, em sintonia com a direção nacional, para propor alternativas que minimizem a problemática.
No Ceará, segundo explicou Márcio Vitor de Albuquerque, em entrevista ao jornal O Estado, “desde de 2010 a OAB/CE, através de sua Comissão de Direito Penitenciário, dentre outras, já encaminhou diversos relatórios ao Governo do Estado alertando para o problema local, inclusive solicitando que fosse decretado o estado de emergência no sistema, precisamente em 2015”.
Segundo ele, a mudança tem início por políticas públicas. “É necessário mais investimentos no sistema como um todo. Também oferta de oportunidade. Agilidade no julgamento dos processos pelo Judiciário que é muito lento, notadamente pela quantidade de presos provisórios (que não foram julgados ainda). Há muitos casos em que há excesso de prazo nas prisões. Aumento da quantidade de audiências de custódia seria outra medida importante”, frisou.
Ressocialização
Ao discorrer sobre as razões estruturais dos problemas, chamou atenção para questões que revelam a inexistência das condições indispensáveis à reintrodução do preso na sociedade. Segundo Márcio Vitor Albuquerque, as condições para a ressocialização do preso incluem, além de trabalho, estudo – formas que levem haver “um futuro fora do sistema que só faz encarcerar”. Outra alternativa, de acordo com ele, seria aplicação de medidas alternativas para presos primários, acusados de crimes mais brandos.
“O uso do monitoramento eletrônico pode ser muito positivo. O fato é que a prisão deve ser a última medida, somente devendo ser utilizada quando não houver outra saída”, salientou o advogado, ressaltando que “ é necessário que haja um trabalho coordenado entre os Estados, pois o problema é semelhante em muitos. A União tem que ser mais ativa nesse processo”.
Ele também se mostrou contrário à privatização dos sistema prisional, pois, segundo Albuquerque, “a segurança pública não pode ser delegada a terceiros”. Sobre as parcerias público privadas, o advogado afirmou que “dependendo da forma como são aplicadas, havendo o controle do Estado pode ser uma medida positiva”. Um grande exemplo, de acordo com ele, são as chamadas “APAC’s” “modelos de unidades onde há parceria com a iniciativa privada e há recuperação de cerca de 80% dos detentos, onde se prioriza o trabalho, a educação, a religião como forma de ressocializar o preso”. Modelos como esse podem ser vistos no interior de Minas Gerais e São Paulo e são exemplos para o Brasil.
Albuquerque abordou ainda o caso mais grave no Ceará envolve os presos provisórios, que chega a 60% do total dos encarcerados espalhados em presídios, cadeias públicas e delegacias do Estado. “É o exemplo de falência da estrutura”, disse.
Mais
O Governo do Estado garantiu R$ 52 milhões a serem investidos no aparelhamento de suas unidades prisionais. O recurso é oriundo do governo federal. O Ceará deve começar a receber o repasse tão logo o Fundo Penitenciário do Estado seja criado. O projeto de lei que cria o fundo aguarda o retorno da Assembleia Legislativa para ser encaminhado à Casa para análise e votação e, em seguida, sanção do governador Camilo Santana.
Projeto
Na semana passada, o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil propôs ao Ministério da Justiça a celebração de um convênio para realizar mutirão de atendimento a pessoas presas e que não dispõem de advogado. A proposta foi feita pelo presidente nacional da OAB, Claudio Lamachia, ao ministro da Justiça, Alexandre de Moraes. Lamachia explica que o foco de atuação serão os presos que já cumpriram pena mas que continuam encarcerados por erro, os que já deveriam ter tido audiência de custódia para avaliar se precisam mesmo ficar detidos e os detidos provisoriamente com situação indefinida. A Ordem já disponibiliza, em todo o país, advogados para atuar em favor das pessoas desprovidas de defesa.
Entidades querem
agilizar processos de presos provisórios
Na última sexta-feira (20), a Ordem atendeu ao convite da presidente do Tribunal de Justiça do Ceará (TJCE), desembargadora Iracema Vale, e se reuniu com representantes do Ministério Público do Ceará (MP/CE), da Defensoria Pública do Estado e do Poder Judiciário com o objetivo de discutir ações conjuntas para agilizar a análise de processos de presos provisórios. A iniciativa atendeu a uma recomendação da presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministra Cármen Lúcia. Para o presidente da OAB-CE, Marcelo Mota, é importante a construção de um plano de ação. “Precisamos reagir. A OAB disponibiliza sua força de trabalho para termos dias melhores. Tenho certeza de que essa reunião renderá grandes frutos para a sociedade”, disse.
Entre as medidas estabelecidas estão: levantamento de comarcas sem defensores públicos e regionalização da Defensoria para ação concentrada em processos com presos provisórios; disponibilização, pela OAB, de advogados voluntários; criação, por parte do Judiciário, de núcleos permanentes de juízes da área criminal em Fortaleza e no Interior; e ampliação do sistema de audiências por videoconferência.
Um novo novo encontro ficou marcado para a próxima quarta-feira, dia 25 de janeiro, às 10 horas. A nova reunião contará com a participação de juízes que atuam na área de execução penal e de representantes das secretarias da Justiça, de Segurança Pública e do Gabinete do Governador do Estado.