De todos os discursos eleitoreiros, o mais cruel e equivocado é o que quer contrapor o lugar dos ricos e o lugar dos pobres. Não por que esses lugares não existam, mas, sim, porque não se opõem. Quem enxerga uma cisão definitiva, um muro como o de Berlim, entre os ricos e os pobres de uma cidade, na verdade, não tem nenhuma habilidade ou interesse de que essa cidade se experimente e se desafie. Há vida, e muita, além desses extremos. Riqueza e pobreza são fatores muito limitados para se pensar uma cidade. Em Fortaleza, por exemplo, nós vivemos um problema absurdo de trânsito. Esqueçam os carros, por favor. Nós aqui podemos até ir, com dificuldade, de um lugar a outro, mas não nos conhecemos porque, ao longo dos tempos, esse discurso de pobreza e riqueza engessou a Cidade. Como aqui nós não temos, ainda, uma cultura de subúrbio, com pessoas com capital financeiro e cultural que moram em regiões mais distantes do Centro, acreditamos que existe a Fortaleza dos ricos e a Fortaleza dos pobres.
Essas cidades podem até existir fisicamente e socialmente, mas não podem existir simbolicamente. Caso contrário, nunca serão subvertidas. O que seria do Rio de Janeiro, se o diplomata Vinícius de Moraes tivesse se trancafiado na sua Zona Sul? Ou, ainda, se o flanelinha Cartola tivesse se limitado a viver no morro da Mangueira? Uma cidade que não circula não se abre aos encontros, não cria perspectivas e, o que é pior, não se coloca diante do desejo de mudar aquilo que precisa ser mudado.
Eleito com o estigma de representar a Fortaleza dos ricos, o futuro prefeito Roberto Cláudio (PSB) tem, agora, uma oportunidade ímpar de provocar a Cidade. Figura pública de maior visibilidade, ele pode assumir o compromisso de fazer Fortaleza circular e rever seus limites. Gestos simples, de janeiro em diante, terão uma força imensa. Basta ele e sua Carol levarem as crianças num domingo ao Passeio Público para que aquele belo cenário do Centro conquiste outros olhares. Talvez, assim, pouco a pouco, a Cidade vença os limites dos pobres e ricos e seja, de fato, de todos. Magela Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo. Editor executivo do Núcleo de Cultura e Entreteni-mento