Você está aqui: Início Últimas Notícias Feminicídio de adolescentes e interseccionalidade são debatidos em webinário na AL
A abertura do evento contou com a performance "Insubmissas" do Negragem, grupo de estudos e teatro atuante no bairro Grande Bom Jardim desde 2017, que objetiva discutir a população negra e promover o orgulho étnico-racial.
O presidente do Comitê, deputado Renato Roseno (Psol), ressaltou a necessidade de desenvolver políticas públicas baseadas em evidências, propor recomendações de prevenção à violência e mobilizar incidência política para que as recomendações sejam adotadas pelos poderes públicos, em especial, pelos gestores municipais. “A gente precisa, sobretudo, superar a segregação que dá curso à violência”, pontuou.
A psicóloga Daniele Negreiros, assessora do Comitê de Prevenção e Combate à Violência, mediou o debate e apresentou e analisou dados estatísticos sobre o assassinato de mulheres e adolescentes nos últimos anos, apontando que, em 2021, mais de cinco mulheres foram mortas por semana no Ceará e, entre elas, uma é adolescente. Daniele indicou ainda que 93% dos casos de morte de mulheres são classificados como homicídio doloso, enquanto apenas 8% são classificados como feminicídio.
Camila Holanda, doutora em Sociologia e professora da Universidade Estadual do Ceará (Uece), trouxe dados do Comitê da AL de que 40% das meninas vítimas de feminicídio convivia com a mãe e o pai, em comparação com 60% dos meninos assassinados, e de que 79% das meninas morava com a mãe, contra 71% dos meninos.
Com isso, ela observou que quem mais protege essas meninas são as mulheres. “Judith Butler fala como a precariedade produz alianças, e essas vidas precárias que essas mulheres resistem cotidianamente na periferia evidenciam a possibilidade de reconstruir, dentro dessas dificuldades extensas, essas outras possibilidades de continuar o curso da vida sob a dor do medo e da saudade”, assinalou.
A professora também frisou que é a partir do reconhecimento da dor do outro que nós nos recusamos à banalidade da violência. “Esses eventos críticos que rompem a vida cotidiana nas periferias também são capazes de produzir eventos que fazem com que as pessoas possam reconfigurar seus mundos e ecoar as suas vozes também. Acho que isso é muito interessante, e que a gente deve fortalecer isso de alguma forma”, acentuou.
Integrante do Fórum Cearense de Mulheres, a assistente social e historiadora Beth Ferreira afirmou que o feminicídio é, sobretudo, um crime de estado, e que a própria lei do feminicídio traz essa definição, pois o estado poderia atuar na prevenção desses crimes, mas não atua.
Ela também alertou para o baixo número de feminicídios registrados, uma vez que a Secretaria de Segurança Pública argumenta que não é possível identificar esses casos. “Se a polícia não registra como feminicídio as mulheres assassinadas por seus ex-namorados e ex-maridos, no caso das meninas, principalmente as adolescentes, elas mais ainda não são registradas como feminicídio”, acentuou.
Beth também comentou o aumento dos índices de violência doméstica e redução do número de denúncias durante o período de isolamento, salientandoqueas mulheres mais pobres são as mais afetadas pela pandemia. “Na maioria das vezes, são mulheres chefes de família, que sustentam a casa, que fazem trabalho precário – seja vender alguma coisa na rua, seja trabalhar com faxina – e não estão conseguindo fazer esse trabalho ou estão fazendo sob ameaça do vírus”, enfatizou.
Verônica Isidorio, integrante da Frente de Mulheres do Cariri, chamou atenção para os assassinatos de meninas trans, comentando sobre a transfobia presente em textos jornalísticos e ressaltando a necessidade de reconhecimento da população LGBTQ+. Ela também lamentou ainda ver autoridades policiais denominando feminicídios de “crimes passionais”.
“Além de ser uma forma de esconder a brutalidade de matar pela posse, ainda é uma forma de fortalecer o machismo na sociedade, se apegar a esse termo para querer justificar o assassinato. Isso mobiliza dentro da gente uma angústia e um descontentamento em relação ao que a gente faz, como se não respeitassem o que já foi estudado até aqui”, pontuou.
Verônica apontou ainda a questão da violação sexual de crianças e adolescentes, que tem crescido durante a pandemia. “Se a gente tem um dado de que 80% da violência sexual contra crianças e adolescentes ocorre no âmbito familiar e nas relações íntimas dessas pessoas, eu olho para o dado e não articulo nenhuma política? Então para que criar dados? Os dados devem servir para qualificar os serviços oferecidos pelo estado e pelas instituições”, argumentou.
BD/LF